Atualmente um smartphone é mais utilizado para mandar mensagens e acessar redes do que propriamente para cumprir a função de telefone celular. Tenho um amigo que, exagerando, diz que telefonar para alguém nos dias de hoje é quase como que uma invasão de privacidade. Já escrevi sobre o uso de aplicativos de envio de mensagens, mas neste texto, o enfoque é sobre um posicionamento trazido pela psicóloga norteamericana Sherry Turkle, a qual escreveu várias obras sobre a psicologia das relações humanas com a tecnologia.

          Em seus livros, argumenta que fica notório o isolamento no qual algumas pessoas encontram-se quando deixam de lado o convívio pessoal para manter majoritariamente relações virtuais. Em qualquer lugar onde houver sinal, sejam salas de aula, de reuniões, palestras, velórios, alguém estará “conectado”, o que fatalmente as afastam de viver o momento presente. Em diversas pesquisas entre usuários de todas as idades e classes sociais, da adolescência à velhice, ela ouviu relatos de que é mais fácil escrever, pois dá para corrigir uma palavra e não ser pego de surpresa com uma pergunta que possa voltar do interlocutor se a conversa for presencial, ou por telefonema. Há ainda a alegação de que rapidamente é possível sair da realidade dura do momento (fuga) para uma ilusória felicidade encontrada na internet. Sherry fala sobre o que aprendeu em sua pesquisa ao ouvir muito repetidamente sobre o sofrimento de se estar a sós: “Aquela sensação de que ninguém está nos ouvindo é muito importante em nossas relações com a tecnologia. É por isso que é tão atraente estar no Facebook ou no Twitter – tanta gente ouvindo automaticamente. E a sensação de que ninguém está nos ouvindo nos leva a querer passar o tempo com dispositivos que parecem gostar da gente.” Como ficam nossas vidas quando esperamos mais da tecnologia e menos das pessoas com as quais convivemos?

          Ela conclui dizendo que os celulares influenciam em nossas relações por nos oferecerem três fantasias gratificantes: “A primeira: podemos concentrar nossa atenção onde quer que nós desejamos; segunda: sempre seremos ouvidos; e terceira: nunca precisaremos ficar sozinhos.” Se suas conclusões são procedentes, uma proposta saudável seria a de podermos concentrar nossas atenções também em outras coisas que não o celular, encontrarmos formas de sermos de fato ouvidos, dialogarmos e também de aprendermos a ficar a sós. A isto, o trabalho psicoterápico pode muito bem auxiliar, pois é possível que se estimule novos interesses em atividades que não sejam aquelas encontradas apenas virtualmente. Há tantas coisas que cada um de nós deseja fazer mas vai postergando, quem sabe, ao largar o telefone por mais tempo (estima-se que a cada seis minutos estamos verificando mensagens e postagens em redes) possamos aprender a tocar um instrumento, a aprender outro idioma, a ler um livro…

          À medida em que tivermos efetivamente “conteúdos” – decorrentes destas mudanças – poderemos ser ouvidos e, quem sabe, aquela sensação de que estamos sozinhos venha a desaparecer. Pense nisto. Digite menos, converse mais, viva mais.

César Augusto – psicólogo

* publicado em setembro de 2019