Existem expressões que ouvimos diariamente e que às vezes as proferimos também: “… Nossa! Já estamos no final do ano; a semana voou; nem vi o dia passar…” e assim por diante. Mas esta preocupação – dupla jornada de trabalhos, estudos, família… – embora pareça fruto da modernidade, tem registros a tempos antes mesmo de Cristo. Um filósofo que fez grandes reflexões sobre o tema onde algumas dessas se encontram na obra de quase dois mil anos com o título “Sobre a brevidade da vida”, é o intelectual Lúcio Anneo Sêneca. Para mim, a parte mais marcante do livro é quando ele faz a seguinte reflexão: “Pergunte à tua memória, quando atingiste a um objetivo? Quantas vezes o dia transcorreu como o planejado? Quando usaste teu tempo contigo mesmo?”.

          Percebam que apenas nestas três linhas encontram-se três breves perguntas que podem nos tirar o sono por noites e noites a fio… (1) Que objetivos atingimos? Eles podem estar relacionados ao nosso trabalho, família, saúde, planos para o futuro ou então, em outro foco, a interrogação (2) sobre se nossos dias acontecem realmente conforme os planejamos. E daí, quanto tempo do dia de hoje foi efetivamente nosso; descontando o do trabalho/estudos, o da atenção (necessária) aos nossos familiares, ou o do tempo perdido desnecessariamente em parafernálias virtuais; (3) quanto de tempo utilizamos para nós mesmos, quer seja para dormir, praticar um esporte, ler um livro, ver um filme, ouvir uma música ou mesmo andar descalço? Quanto dele utilizamos para viver?

          A obra de Sêneca já nos chama a atenção há muitos séculos sobre o quanto a vida passa rapidamente, queiramos ou não. Já critiquei aquela frase “Tempo é dinheiro” por entender que não é, pois dinheiro podemos acumular e poupar para o utilizarmos depois… Tempo não, temos um dia de 24 horas do qual não podemos separar uma ou duas delas para acumularmos e nos beneficiarmos noutra data.

         É claro que não estou sugerindo correrias dando a ideia de que assim aproveitaremos em quantidade até o último segundo, pelo contrário, proponho que saboreemos os dias em qualidade. Para tanto, diminuir o ritmo, avaliar o que realmente é importante para o momento, desobrigar-se de correr atrás de aquisições que o consumismo nos provoca dando-nos a sensação de que as precisamos – para depois corremos atrás para pagá-las – ou seja: mudança de postura.

         A tudo isto o trabalho psicoterápico se propõe a discutir quando decidimos por utilizar o tempo para “conosco mesmo”, como sugere o filósofo. O fato é que, com correrias ou com o vagar de quem vive a cada momento, os dias passarão, e, na magia do poeta Mário Quintana, temos a síntese no poema Relógio: “O mais feroz dos animais domésticos é o relógio de parede: conheço um que já devorou três gerações de minha família.”

César Augusto – psicólogo

* texto publicado em outubro de 2019