Gosto deste ditado, sua mensagem é muito clara e objetiva: na vida devemos encontrar um meio termo, um ponto de equilíbrio em tudo. Na cultura budista o “Caminho do meio” – numa das interpretações – é o de agir com prudência para evitar-se extremismos, é a prática da moderação. Por sua vez, na mitologia greco-romana, vamos encontrar o mito de Dédalo e seu filho Ícaro. Estando aprisionados na ilha de Creta pelo Rei Minos, constroem armações (asas de madeira) e as forram utilizando-se das penas de pássaros e cera de abelhas planejando fugir voando, pois, com a terra e o mar vigiados, a fuga somente poderia ser pelo alto. As asas funcionaram e Dédalo, prudente, aconselhou a seu filho que não voasse tão baixo ao alcance das ondas do mar e nem tão alto próximo ao sol. Entusiasmado por voar como os pássaros e admirado com a sensação de liberdade, no ímpeto de sua juventude ignorou o conselho do pai e voou cada vez mais alto, até que a cera de suas asas acabasse por derreter-se, desprendendo as penas das asas. Sua queda foi inevitável e o empolgado rapaz desapareceu no mar, na região hoje conhecida como Icária.

          História à parte, como estamos nos comportando em tempos de pandemia? No Brasil, o mês de março marca oficialmente a primeira morte decorrida do Covid-19 a um ano. Sustos, medos, frustrações, decepções, sonhos esboroados, prejuízos sociais, financeiros, afetivos, mortes… quantos acontecimentos! No relato, o sábio conselho paterno com o pedido para que o filho soubesse suportar o momento da fuga (passageiro como a pandemia) que os conduziria à liberdade. No encanto do filho com a possibilidade de voar como os pássaros pela liberdade que se construía sob a égide da prudência, irresponsavelmente, o jovem não conseguiu conter-se ao conselho e precipitou-se à morte. Quantas vezes temos culpados os jovens por “aglomerações” desaconselhadas em tempos de pandemia? Como lidar com sua impetuosidade?

          “Tudo é uma questão de manter, a mente quieta, a espinha ereta, e o coração tranquilo” já nos dizia o poeta. Mas como encontrar este ponto de equilíbrio? A tradição chinesa nos brinda com o muito conhecido círculo (preto & branco) que contém a dualidade Yin e Yang; para os chineses, o mundo é composto por essas forças opostas e achar o equilíbrio entre elas é essencial. Tanto o que é demais, quanto aquilo que é de menos, fere este princípio.

          Em tempos pandêmicos, novos levantamentos apontam para um aumento em 17% no consumo de medicação utilizada para tratamentos de ansiedade no Brasil; é mais uma das tentativas de buscar-se o equilíbrio emocional. Fiquemos com a sabedoria de Dédalo, pois ignorar o momento coletivo em que vivemos é tão insano quanto superestima-lo ao ponto de nos paralisarmos. Se não temos a liberdade de circularmos em viagens ou visitas; se não podemos nos reunir com familiares e amigos como gostaríamos; se por mais discreto que seja o encontro que queremos e este caracterize uma aglomeração que possa representar riscos, vamos nos conter.

          O ponto de equilíbrio que poderá nos manter saudáveis (e aos nossos) passa, obrigatoriamente, pelo amor a si mesmo e ao próximo. Se a ordem dos fatores não altera o produto, isso não é uma Lei Divina? Ame-se!

César Augusto – psicólogo

* publicado em março de 2021